domingo, 8 de maio de 2011

Que samba é esse?

Há uma pergunta em Noêmia Carolina à Carolina de Jesus: ‘O que significa o samba na cultura brasileira?’
Carolina em seu barraco de madeira, dentro do Museu Afro se incumbe de abrir as portas da literatura e contar algumas histórias.
Histórias parecidas com as suas, negra retinta que chegou ainda criança de Sacramento, Minas Gerais, direto para uma casa de madame em São Paulo, onde Carolina se alegrava quando ia tirar o pó dos livros novos, nunca lidos, esquecidos que estavam na estante da madame.
À noite, esperava a madame dormir para voltar às estantes e viajar até Sacramento, através de histórias parecidas com as que seu avô, famoso contador de causos do sertão mineiro, preenchia o imaginário da neta pretinha.
Para ela, ele era o seu  Sócrates Africano e descobriu isso quase por acaso.
Levou essa lembrança consigo por toda vida, tornou-se escritora, descoberta por um jornalista na porta de seu barraco, numa favela no bairro de Canindé, hoje um estádio de futebol, onde ela sentava-se todas as tardes, após chegar com seu carrinho carregado de papelões, ferros, jornais e às vezes livros.
Livros esses, não tão novos como os da casa onde trabalhava, mas bons o suficiente  para preencher seu diário com aquelas palavras bonitas.
Quarto de despejo, diário de uma favelada. Carolina falou da vida, do seu dia a dia, das feridas da alma, da sua luta, de seus amores e de seus filhos.
Conseguiu juntas alguns trocados, um pouco mais do que conseguiu com seu carrinho e foi morar bem longe, numa casa de alvenaria, que deu título ao seu segundo livro publicado, que relata sua vida fora da favela, onde era rechaçada só por querer escrever. Até seu novo Bairro com características mais nobres a discriminava por ser a única negra com três filhos pra criar, sem marido e que ainda por cima não dependia de ninguém para lhe sustentar.
Seus direitos autorais conseguidos através do livro Quarto de Despejo, editado em mais de 20 países, foram suficientes para que Carolina se motivasse para gravar um long play com composições sua.
Mas mesmo assim, uma hora a fonte secou e Carolina teve que voltar às ruas, acompanhada de seu velho carrinho de madeira, grande conhecedor de becos e vielas de onde Carolina poderia tirar o  sustento para sua vida e de seus filhos sem pai.
Essa é a resposta de Carolina de Jesus à Carolina de Souza lá do outro lado do Atlântico.
Esse também é o nosso samba!

Paulo
Abril de 2011

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