domingo, 15 de janeiro de 2012

Pendenga entre Nego Dito e Negro Gato

Pra quem assistia samba de bumbo no Tietê com rezas do seu Geraldo e teve que mudar pra Cascavel, até que Nego Dito era calminho, na medida do possível. Gostava de brincar com as palavras e ouvia falar que no Rio tinha outro Nego, o Negro Gato.
Esse,  era garoto esperto, subidor de morro e gingado descolado, já, ‘Nego Dito Cascavel vulgo beleléu’ era magrinho, perna fina, jogava bola e sambava no terreiro.
O Negro Gato, floreava as palavras, era bom na pipa, subia na laje, fazia poemas e dialogava com o mundo com sua fala afiada, não como o blá, blá, blá de Nego Dito, mas nem tão diferente assim... uma de suas frases era: ‘se chamar a polícia a boca espuma de ódio!’
Nêgo Dito tinha um jeito todo especial, óculos escuro, aros vermelhos e várias outras cores, cabelos trançados, calças de couro, coletes coloridos, sapatos macios. Pisava como uma pluma sobre flores, sobre as orquídeas, que era as que mais apreciava, apesar de ser da pá virada.
Já Negro Gato, gostava de óculos de aros brancos e pingos de ouro nas pontas. Tinha toques de arco-íris nas pernas das calças e cabelos como se fossem tranças e na verdade eram...
Subiu o morro como se tivesse sete vidas e tinha, fugia dos inimigos, pulava entre as vielas e saltava para o mar... na praia jogava sua bola, versava sobre fadas, pérolas negras e brancas sobre sua mãe que lavava roupas todos os dias. Enquanto isso, seu pai fazia musica e encantava as almas e Negro Gato aprendia sua melodia.
Procura-se um mestre.
Dito que ouvira a estrofe: ‘eu daria tudo que tivesse para voltar aos tempos de criança’ ficou mais que esperto, arrancou os  óculos prateados e seguiu em direção ao som que ecoava entre montanhas e vales. O cenário era verde e a vontade de chegar parecia com a vontade de chupar laranjas maduras na beira da estrada.
‘Cai fora malandragem, não meta a mão em cumbuca’, quem dizia isso, era um preto velho magro, estiloso com uma bengala na m,ao direita e um lenço branco na esquerda, um perfeito griot. Nego Dito arrepiado e com os cabelos em pé, saltou de lado, cruzou os dedos, mas não perdeu a pose, falou em alto e bom tom: ‘covarde sei que me podem chamar’. O griot deu risada...
Já Negro Gato ficou sabendo de uma cabritada lá no morro, colocou seu terno branco combinando com o sapato e o chapéu panamá, mal entrou na festa, viu um camburão subindo a rua e todos saíram correndo deixando o cabrito sozinho no meio da mesa... Negro Gato ainda parou no meio do Caminho mas uma voz ao longe gritou: ‘ei malandro, não meta a mão em cumbuca’. Era um capoeirista com um berimbau colorido, um belo sorriso e seu refrão preferido era: ‘o escurinho, era um escuro bonitinho que lá no morro tinha fama de brigão’, também era um mestre!
Voltando às Montanhas.
‘Meu, você sai lá da ZL, vem pra minas, especificamente Miraí, atrás de um griot e esquece que do seu lado tem um nego velho, com sapatos engraxados, pandeiro na mão e que também é um grande contador de histórias. Gosta de samba como ninguém, veio de Minas como eu, cai no congo, no dendê e seu nome é Nenê.
Mora do lado da sua casa, sabe aquela rua em frente a quadra do samba? Lá ele montou uma escola que ensina a meninada a tocar bumbo, cuíca, reco-reco, frigideira e tambor. Dizem que ainda dá uns passos de capoeira e também joga tiririca.
Quando você for à feira escolher laranjas, dê uma passada por lá e converse com ele, acho que você vai gostar’.
Voltando ao Morro.

‘Oi cara! Você atravessa o morro, pra se dar mal, sendo que do seu lado  tem um fulano todo bonitinho, bengala em cima, colarinho passadinho, camisa listrada e também cheio de boas intenções, quer montar uma escola.
Dizem, que não deixaram, nem ele , nem seus amigos, freqüentarem as outras... Aquelas que  apenas  alguns tem permissão’.
Seu Ismael era o cara!









quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Dona Cize e o Doutor

O Doutor correu pela direita, virou o corpo, foi pra esquerda, gingou e saiu pelo centro. Enganou todo mundo. Fez o gol mais esquisito da sua vida, quer dizer, deixou o time com um a menos.
Falou em campo, bradou na geral e descansou nos bares...Pediu uma gelada e compartilhou com os ouvintes. Golaço!!!
Cantou, representou, brigou, fez tabelas, subiu em palanques... Sua voz ecoou, foi ouvido.

Colocou sua tiara como símbolo de resistência, queria levantar o braço e protestar, nunca estava satisfeito, queria sempre mais.

Já Dona Cize, andava descalça, nas areias de Salamansa, por pura sensibilidade de caminhar nas areias lisas e cercada da cor azul ou verde de um atlântico que foi rota de tráfico de escravos, que aqui cresceram e foram proibidos de usar sapatos...
Por isso, ela resolveu seguir a rota ao contrário, e foi até os colonizadores se apresentar de pés descalços e por isso, tornou-se diva.
Cantou e encantou o mundo, saiu pelo mar, alguns dizem que virou sereia e em noite de lua cheia ainda canta descalça para o mundo e para aquele doutor de tiara na cabeça.
Ambos continuam protestando, cada um a seu jeito, mas a música é uma só: Sodad, sodad de nha terra....