sábado, 28 de maio de 2011

NO PAÍS DOS HOMENS


A literatura africana às vezes ajuda a interpretar com olhares diferenciados certos momentos políticos que acontecem longe dos nossos olhos.
É o caso de “No País dos Homens”  de Hisham Matar, escritor que nasceu em New York, de ascendência Líbia, que passou a infância em Trípoli e no Cairo.
Hisham retrata o ponto de vista do pequeno Suleiman, que sob o efeito de alguns fantasmas da vida tenta decodificar uma Líbia incomodada com abusos da polícia política patrocinada  pelo todo poderoso Muhamar Al-Kadhafi.
Alcunhado de Filho do Deserto, símbolo de esperança e liberdfade, Kadhafi controla com mãos de ferro, um país com vários interesses econômicos e com posição geográfica estratégica, próximo à Itália, Egito e Grécia. Ora, apoiada pelos EUA, ora por Sarkozi e ora por Berlusconi.
Adepto entusiasmado do Bunga-Bunga, coreografia usada aos montes nos puteiros da Itália, Kadhafi junto com seu filho, comprou metade de um tradicional time da Itália, a Juventus. Também dava dinheiro às Universidades Inglesas onde seu filho conseguiu doutorar-se.
Carneirinho fora do país, Kadhafi torna-se um lobo sanguinário e faminto.
Insaciado na ganância do capital e do poder,  incontrolável na perversidade, o todo poderoso não mede sacrifícios para afastar de seu caminho aqueles que não concordam com suas idéias, suas atitudes, suas explorações, seu sadismo e outra enorme gama de valores.
Resta a esses insubordinados, serem taxados de contra revolucionários e serem julgados no estádio nacional de basquete, por um júri ligado à família e aos amigos do todo poderoso.
O resto já sabemos, muito parecido com o que Pinochet patrocinava no Chile e que nossos milicos tão bem desempenhavam no Brasil.
Só que tudo isso assusta crianças e adultos e o garoto Suleiman queria apenas contar essa história e entender um pouco mais sobre o seu país de homens.


Matar, Hisham. No País dos Homens.  Companhia das Letras. São Paulo. 2007.

domingo, 8 de maio de 2011

O lugar onde eu moro...


Moro na cidade Patriarca há mais de 20 anos. Tenho família no bairro e também fora dele. Trabalho, estudo e cuido de casa. Acho interessante morar na Cidade Patriarca, pois apesar da distância, é um lugar tranquilo, com aspecto de interior, devido à suas praças e o pouco barulho de trânsito.
E o que tem de bom? O sossego, apesar de ter poucas atividades de lazer. Não tem cinema, teatro, clubes ou praças de esportes. O que eu gosto mesmo, é do sossego, apesar da falta de lugares para o lazer e de espaços culturais como bibliotecas etc.
A diferença da Patriarca com os outros bairros, na minha opinião, é a calma que existe por aqui. Geralmente procuro ler quando estou no transporte coletivo, aproveitando esse tempo, que às vezes é demorado. Para sair desse bairro, só mesmo mudando de Estado.
Gosto muito de voltar para casa, pois me sinto um pouco fora da realidade de São Paulo, calmaria, sossego, sem barulho... É sempre bom ter um cantinho tranquilo para morar.
Que atividades gosto de fazer? Gosto de ler, ir ao cinema, assistir shows, teatro, visitar amigos, dançar e namorar.
O que poderia fazer para melhorar o lugar que você mora? Juntar-me com alguma associação de moradores, no sentido de cobrar do poder público, políticas condizentes com as propostas eleitorais.
Pensando no lugar que olho todos os dias, acho que as coisas podem ser diferentes, às vezes em virtude das próprias transformações dessas coisas, objetos, natureza, como também pela nossa influência em transformá-las.
Se for animal doméstico, as mudanças de lugares, provocadas às vezes pelo dono, ou pelo próprio cachorro, principalmente na perfieria onde fica solto mas quando a carrocinha passa tem que estar amarrado. E os gatos que dependendo da fase e dos venenos na comida ficam mais recatados.
A sensação de olhar para algo que com frequência passamos e não notamos, depende muito do  momento em que estamos e da nossa sensibilidade para um novo olhar, pois para mim, este fato novo, não passa a existir a partir de meu olhar difetrenciado. Ele já existe de certa forma, mas o jeito de vê-lo, às vezes com certo desdém, é como se não existisse, ou não tivesse valor.
O mundo com olhares de todos os seres, talvez fosse bem mais interessante do que um mundo com um único olhar, que talvez seja o mundo no qual estamos vivendo agora! Um mundo com o olhar da ganância, do poder, do mais forte.
Esse outro olhar, o da contra indicação, da contra corrente, iria deixar o mundo bem mais interessante, mais colorido e menos sombrio.
Para onde eu costumo olhar mais? Para o distante, desde que eu possa enxergar um pouco.

Os dedos cheios de Deus

Sinto saudades do Teatro Adoniran Barbosa, principalmente quando acontecia o Projeto das seis e meia.
Assisti vários shows, grandes talentos da música brasileira. Lembro-me de Monarco começando em São Paulo, Martinho da Vila, João Nogueira e tantos outros.

Foram momentos especiais de muita música boa! Dos espetáculos que mais me emocionaram, lembro-me especialmente do Show do Guinga. Nesse dia, consegui entrar antes do início da apresentação e assisti o Guinga ainda passando o som.
Por descuido técnico, o som estava alto e Guinga pediu com toda a delicadeza para o técnico abaixar um pouquinho.
Durante o Show, Guinga foi excepcional. Apresentou-se com a mesma delicadeza com a qual se dirigiu ao técnico de som durante o ensaio, o que fez o público se encantar ainda mais com seus “dedos de Deus”.
Quando o show acabou, Guinga apresentou os técnicos de luz e som se desculpando por achar que havia sido ríspido com um deles quando pediu para que abaixasse o volume.
Claro que não foi ríspido, eu estava lá como testemunha!
O que também marcou esse encontro foi um abraço coletivo do público com o artista, proposto por Guinga e comemorado entusiasmadamente por mim e Zé Maria que também estava na platéia.
Naquela noite fui dormir feliz por ter conhecido mais de perto um dos Deuses da música, cheio de dedos... Santos dedos... na cartola do Adoniran. Já era bem mais que seis e meia!

Na Galeria

Apesar de não gostar muito de Rock, sempre gostei de samba-rock quando comecei a freqüentar a galeria.
Precisava cortar o cabelo e me indicaram um barbeiro novo que estava fazendo a cabeça da negrada.
Saí do salão com um excelente Black feito por Gê e graças a ele, no baile da noite fiz o maior sucesso. Minha estética foi aprovada!
Voltei no mês seguinte e fui subindo para outros andares, descobri outras coisas, outras cores, outras músicas, outros estilos e porque não, outras estéticas.
Visitei lojas de máquinas fotográficas, discuti sobre fotografias, apreciei o preto e branco, fotografei com a rolei-flex e voltei para o futuro.
Chegando lá, vi punks com e sem cabelos, pretos, brancos, vermelhos, azuis. Assisti ao desfile de modas, diferentes do meu cabelo Black, com outros coloridos. Vi uma nova estética, tudo em 3D e tudo bem, cada qual, no seu cada qual!

Paulo
Abril de 2011

O Samba de Carolina Noemia de Souza

No oco salão de baile
Cheio de luzes fictícias da civilização
Dos risos amarelos
Dos vestidos pintados
Das carapinhas desfrisadas da civilização
O súbito bater da bateria do jazz
Soou como um grito de libertação
Como uma lança rasgando o
Papel celofane das composturas forçadas

Depois,
Veio o som grave do violão
A juntar-lhe o quente latejar das noites
De mil ânsias de mãe África
E veio o saxofone e o piano
E as maracás matraqueando, ritmo de batuques
E todo salão deixou a hipocrisia das composturas encomendadas
E vibrou
E vibrou ....

As luzes fictícias deixaram de existir
E quem foi que disse que não era o luar de Shigombelas
Aquela luz suave e quente que se derramou no salão
Quem disse que as palmeiras e os coqueiros
Os cajueiros,
Os comboleiros,
Não vieram com suas silhuetas balouçantes
Rodear o batuque.

Ah na paisagem familiar
Os risos se tornaram brancos como mandioca,
Os requebros na dança traziam a febre primitiva
De batuques distantes
E os vestidos brilhantes da civilização, desapareceram.
E os corpos prosseguiam vitoriosos,
Sambando e chispando,
Dançando, dançando

Os ritmos fraternos do samba
Trazendo o feitiço das macumbas,
O claro Bater das marimbas gemendo
Lamentos despedaçados de escravos
Oh ritmos fraternos do samba quente da Bahia
Pegando fogo no sangue inflamável dos mulatos
Fazendo gingar os quadris dengosos das mulheres

Entornando sortilégio e loucura
Nas pernas bailarinas dos negros. 
Ritmos fraternos do samba
Herança de África que os negros levaram
No ventre sem sol dos navios negreiros
E soltaram carregados de algemas e saudades
Nas noites mornas do Cruzeiro do Sul.

Oh ritmos fraternos do samba
Acordando febres palustres no meu povo
Embotado das doses do quinino europeu
Ritmos africanos do samba da Baia
Com maracás matraqueando compassos febris
O que é que a baiana tem, que é?
Violões tecendo sortilégios
E atabaques soando secos, soando

Oh ritmos fraternos do samba
Acordando meu povo adormecido dos emboladeiros
Dizendo na sua linguagem encharcada de ritmos
Que as correntes dos navios negreiros não morreram não,
Só mudaram de nome, mas ainda continuam, continuam...
Oh ritmos fraternos do samba!

Que samba é esse?

Há uma pergunta em Noêmia Carolina à Carolina de Jesus: ‘O que significa o samba na cultura brasileira?’
Carolina em seu barraco de madeira, dentro do Museu Afro se incumbe de abrir as portas da literatura e contar algumas histórias.
Histórias parecidas com as suas, negra retinta que chegou ainda criança de Sacramento, Minas Gerais, direto para uma casa de madame em São Paulo, onde Carolina se alegrava quando ia tirar o pó dos livros novos, nunca lidos, esquecidos que estavam na estante da madame.
À noite, esperava a madame dormir para voltar às estantes e viajar até Sacramento, através de histórias parecidas com as que seu avô, famoso contador de causos do sertão mineiro, preenchia o imaginário da neta pretinha.
Para ela, ele era o seu  Sócrates Africano e descobriu isso quase por acaso.
Levou essa lembrança consigo por toda vida, tornou-se escritora, descoberta por um jornalista na porta de seu barraco, numa favela no bairro de Canindé, hoje um estádio de futebol, onde ela sentava-se todas as tardes, após chegar com seu carrinho carregado de papelões, ferros, jornais e às vezes livros.
Livros esses, não tão novos como os da casa onde trabalhava, mas bons o suficiente  para preencher seu diário com aquelas palavras bonitas.
Quarto de despejo, diário de uma favelada. Carolina falou da vida, do seu dia a dia, das feridas da alma, da sua luta, de seus amores e de seus filhos.
Conseguiu juntas alguns trocados, um pouco mais do que conseguiu com seu carrinho e foi morar bem longe, numa casa de alvenaria, que deu título ao seu segundo livro publicado, que relata sua vida fora da favela, onde era rechaçada só por querer escrever. Até seu novo Bairro com características mais nobres a discriminava por ser a única negra com três filhos pra criar, sem marido e que ainda por cima não dependia de ninguém para lhe sustentar.
Seus direitos autorais conseguidos através do livro Quarto de Despejo, editado em mais de 20 países, foram suficientes para que Carolina se motivasse para gravar um long play com composições sua.
Mas mesmo assim, uma hora a fonte secou e Carolina teve que voltar às ruas, acompanhada de seu velho carrinho de madeira, grande conhecedor de becos e vielas de onde Carolina poderia tirar o  sustento para sua vida e de seus filhos sem pai.
Essa é a resposta de Carolina de Jesus à Carolina de Souza lá do outro lado do Atlântico.
Esse também é o nosso samba!

Paulo
Abril de 2011

sábado, 7 de maio de 2011

Tempero da Vida

Uma porção de sal ou açúcar, está aí a diferença sobre como saboreamos o abacate. De um lado no desjejum, de outro, na sobremesa e cada um se acerta conforme o paladar...
Aqui tem raiz verde e lá também, em outras paragens há buchada com coentro e cheiro verde. Verde de esperança numa vida que sem tempero fica difícil de levar!
Algumas palavras adicionadas ao encanto, um pouco de emoção, uma dose de tolerância, eis a melhor receita para se degustar uma deliciosa paeja, que feita com carinho faz lembrar o sarapatel com cordel, ou uma boa  feijoada acompanhada  de samba ou blues.
E tem também o açaí, o caruru ou cururu, putchero, simbomba, a zabumba pra alegrar, trovas e trovão também pode ser uma possibilidade e uma ocasião par se falar dos verdes temperos da vida!